terça-feira, 9 de outubro de 2012

Beijo


"...O mundo parou.
Sombras pousavam-lhe, transparentes, na pele do rosto. O ar fresco, arrefecido, moldava-lhe a pele do rosto.
E o mundo continuou.
Ajudei-a a descer.
Corremos pelo passeio de mãos dadas. A minha mão a envolver a mão fina dela: a força dos seus dedos dentro dos meus.
Na noite, os nossos corpos a correrem lado a lado.
Quando parámos: as nossas respirações, os nossos rostos admirados um com o outro: olhámo-nos como se nos estivéssemos a ver para sempre.
Quando os meus lábios se aproximaram devagar dos lábios dela e nos beijámos, havia reflexos de brilho, como pó lançado ao ar, a caírem pela noite que nos cobria."

José Luís Peixoto, in 'Cemitério de Pianos'